sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

A estátua de sal

Nunca gostei de olhar pra trás.
O saudosismo é a âncora da alma e preciso que a minha esteja sempre leve para alçar novos vôos.
Por isso não gosto de reencontros de ex-alunos, ex-colegas de firma, ex-tudo que vivi.
Pelo simples motivo de que cada vez que minhas pálpebras se abrem é como se meus olhos saltassem numa nova dimensão de tempo e espaço onde não cabe o passado.
Os que acreditam em coexistência no tempo dirão que estou equivocado, já que eles acreditam um dia poderem visitar o meu eu passado e futuro também.
Mas até prova dessa teoria, sou totalmente cético ao apego ao que já fui.
Dizem também que a memória nubla o passado e reconstróis aos fatos convenientemente à nossa vontade, ou pelo menos à vontade do nosso inconsciente.
Mais um motivo para deletar de vez o passado, já que nesse caso estaríamos revivendo um passado inventando por nós mesmos.
O que equivale a viver um futuro que ainda não veio.
Sei que a vida é curta e contar com as lembranças do passado é abrandar o pavor do tique-taque incessante que nos condena ao inevitável.
Mas nem por isso prefiro reabrir meu baú cheio de cartas contadas a mim mesmo.
Prefiro o medo do papel em branco do futuro do que esse revirar de ruínas de memória que não me leva a nada.
Não sei se a mulher de sal bíblica representa a propensão humana a olhar para que o foi deixado.
Não conheço a história da mulher de Lot.
Sei que à revelia da ordem de Deus, ela olhou para Sodoma e Gomorra destruídas e foi penalizada.
E mesmo que eu tivesse duas cidades inteiras de pecados povoando meu passado, se possível eu tentaria com todas as forças me absolver desse carga.
Os arrependimentos, principalmente pelo que não fiz, já são um sofrimento recorrente nas minhas noites mal dormidas.
Suficiente dolorido para que eu não procure nem nas minhas melhores lembranças a redenção para um presente insatisfatório ou para um futuro que sempre será incerto.


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