domingo, 7 de dezembro de 2014

Augusta rua

Alguns lutam a vida inteira para tornar um sobrenome importante.
Ela atravessa décadas consagrando um singelo primeiro nome como símbolo do apogeu e queda de uma região: a Rua Augusta.
A Augusta já representou a opulência aristocrática, o endereço de luxo das mais importantes grifes à disposição dos abonados paulistanos - hoje foi superada pelo tal de Oscar, que precisa de um Freire na frente para merecer o mesmo respeito de sua antecessora.
Pelas ruas da Augusta, muito antes dos motoboys ameaçarem decapitar qualquer desavisado que ousasse colocar a cabeça para fora, eram comuns os emparelhamentos de carros, onde paquerantes e paquerados trocavam olhares, galanteios e números de telefone.
Hoje em dia fica difícil imaginar por ali um desfile de beldades em capotas abertas, a não ser numa ação de marketing fake.
Em seguida, dominada em sua região mais baixa pelas saunas e meretrícios, a Augusta virou antro do submundo, por onde os mais envergonhados passavam olhando as vitrines e putas de esguelha, ao contrário dos libertinos, que não se rogavam em parar o carro em busca de companhia de fim de festa.
Mais recentemente, em tempos de cultura hype, a Augusta tomou a dianteira como QG do underground paulistano, passando a abrigar, entre bares, baladas, lojas e puteiros, os points mais cool da cidade, concentrando o maior índice de biodiversidade por metro quadrado da cidade.
Algo semelhante à Reeperbahn de Hamburgo, que reúne baladas cool com uma miniatura do red light district de Amsterdam, juntando quem vive à noite com quem vive da noite sem nenhum preconceito.
Basta sentar-se à uma mesinha da Augusta no fim da tarde do sábado para observar a troca de guarda de seus frequentadores.
Aos poucos os estudantes de sociais amantes do papo e da breja gelada darão lugar a punks, freaks e espécies afins, refletindo nas calçadas os brilhos das fechadas de neon.
Há também os mais comportados, que acabaram ali apenas para uma sessão de cinema, show de stand-up ou um lanche do Frevinho.
Esses só estão ali para comprovar a vocação plural da Augusta.
Pena que essa pluraridade esteja com os dias contados, com a especulação imobiliária engolindo mais uma vez os 15 minutos de fama de suas fachadas coloridas.
Mas ainda que o tsunami urbano atravesse o leito da rua e ponha abaixo sua caracterização, a Augusta conservará em seus genes sua capacidade de ser vanguarda sob qualquer condição.
Coisa que sua prima esnobe e coxinha, a Avenida Paulista, não conseguiu manter.

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