quarta-feira, 8 de junho de 2016

Dancing with my selfie

Num final de semana em que meu sobrinho estava em São Paulo estavamos à caça de um programa para os pequenos quando minha prima se lembrou de uma exposição que poderia agradar tanto a adultos quanto crianças.
Era a exposição de Ron Mueck, um criador de esculturas hiper-realistas que se tornara pop e estava atraindo multidões por onde passava.
Mas tinha um porém: era final de semana.
E um agravante: o último dia da exposição.
Pensei ôu-ôu, isso não vai dar certo e fui logo avisando que por mim nem tentaria ir.
Mas fui voto vencido e lá fomos nós. Não precisamos chegar à porta da Pinacoteca para avistar uma fila quilométrica a umas 5 quadras da entrada, que confirmava minha previsão de que seria impossível entrar.
Tudo isso foi só pra dizer o quanto eventos culturais assim se tornaram frequentes, atraindo um público não necessariamente interessado no talento de um Ron Mueck.
Você percebe que boa parte daquele gente que sofreu horrores naquela fila está lá pelo oba-oba, para garantir seu post do dia com uma selfie num programa "in".
Fica claro que a curadoria busca isso, interessada em cobrir os custos de exposição e ainda tirar uma boa margem de lucro.
Os organizadores estão errados? Claro que não.
É o mesmo apelo que já trouxe para cá exposições como de Leonardo Da Vinci, Kubrick e mais recentemente, Tim Burton.
Um pé no popular e o outro, quando possível, no erudito.
Mas será que ao atrair esse público mainstream para um espaço de interesse de nicho, estamos de fato formando novos consumidores de arte?
Note bem que não disse apreciadores, porque só consigo enxergar como consumidores pessoas que vão passar ali para bater ponto, tirar a selfizinha e sair, cometendo a contradição de permanecer uns 20 minutos num evento pelo qual esperaram até 4 horas para entrar.
Não acredito que isso forme gente interessada em arte de verdade.
Talvez uma minoria se salve.
E afirmo isso baseado em outro fenômeno cultural que parece ter tentado a mesma coisa, mas sucumbiu.
Refiro-me ao mercado editorial, onde a proliferação de histórias de magia à la Harry Potter e Game of Thrones não trouxe mais leitores para a alta literatura.
É como acreditar que os que compram canecas do Romero Britto também comprariam outras com as pinturas negras de Goya.
Por que você acha que o Britto, que não é nem um pouco bobo, escolhe temas como gatinhos, coraçõezinhos e borboletas para pintar?

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